Justiça limita processo eletrônico
Fonte: Valor Econômico, Legislação & Tributos, 07/10/2010
Em papel, o processo judicial pode ter qualquer tamanho. No formato eletrônico, no entanto, está limitado a dois megabytes (MB), em média. Se precisar ser impresso, não pode ultrapassar um determinado número de páginas, sob o risco de não ser aceito. As restrições impostas por tribunais na regulamentação da Lei nº 11.419, de 2006, que trata da informatização do processo, começam a gerar problemas para os advogados. Em Minas Gerais, por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) manteve decisão de primeira instância que rejeitou recursos que extrapolaram o limite de 50 folhas impressas.
A Lei nº 11.419, questionada no Supremo Tribunal Federal pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), não trouxe qualquer limitação quanto ao tamanho das peças processuais – em megabytes ou em número de folhas. Mas deixou a cargo dos 92 tribunais do país a sua regulamentação. A maioria, segundo levantamento realizado pelo advogado mineiro Alexandre Atheniense, ex-presidente da Comissão de Tecnologia da Informação da OAB Federal, optou por arquivos de, no máximo, dois MB e em PDF – Portable Document Format. No Supremo e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceita-se um volume maior de dados, de 10 MB e arquivos fracionados de 1,5 MB, sem limite, respectivamente.
Na esfera trabalhista, no entanto, a Instrução Normativa nº 30, de 2007, editada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), estabeleceu o tamanho máximo das peças processuais em dois megabytes. Mas não tratou da impressão em papel. O problema foi gerado porque em boa parte do país ainda há um processo judicial híbrido – peticionado eletronicamente, mas ainda com tramitação em papel. Em Minas Gerais, o TRT editou a Instrução Normativa nº 3, de 2006, limitando os arquivos em, no máximo, 50 folhas impressas – respeitado o limite de dois megabytes -, sob pena de não serem aceitos.
No caso julgado pela 5ª Turma do TRT de Minas Gerais, a secretaria da 2ª Vara do Trabalho de Divinópolis deixou de imprimir recursos enviados pelo Banco Santander e pela HolandaPrevi Sociedade de Previdência Privada (hoje SantanderPrevi), que possuíam, respectivamente, 67 e 99 folhas. As partes apresentaram posteriormente os recursos em papel, mas foram considerados intempestivos – fora do prazo legal. Com a decisão, as instituições apelaram para a segunda instância, por meio de agravos de instrumento, que foram negados pelos desembargadores.
Ao analisar o caso, a desembargadora Lucilde D’Ajuda Lyra de Almeida, entendeu que “a Lei nº 11.419 fixou as normas gerais acerca da matéria, no entanto, permitiu que cada órgão do Poder Judiciário estabelecesse normas especiais que levam em conta os recursos de informática de que dispõe, o que, ao contrário do que afirmam os agravantes, não afronta o inciso II do artigo 5º da Constituição da República de 1988”. Segundo a magistrada, o TRT de Minas estipulou que cada peça não pode ultrapassar 50 páginas “porque, ao exceder essa quantidade de folhas, o arquivo supera o máximo de dois megabytes”.
Os advogados do Banco Santander e da HolandaPrevi, Paulo Sogayar Junior e Jose Edgard da Cunha Bueno Filho, do escritório J. Bueno e Mandaliti Sociedade de Advogados, já recorreram da decisão, por meio de embargos de declaração. Nos recursos, alegam que os arquivos enviados não ultrapassaram os dois megabytes estabelecidos, como concluiu a relatora do caso. “Se tivesse excedido, o sistema rejeitaria o arquivo”, diz Sogayar Junior. “É absurdo, configura cerceamento de defesa”, acrescenta Bueno Filho.
Na maioria dos tribunais, não há limite para o número de folhas impressas. O problema está concentrado basicamente na Justiça do Trabalho. Nos Estados de Minas Gerais, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Rio de janeiro, os advogados devem tomar cuidado com a quantidade de páginas. Para o advogado Alexandre Atheniense, autor de um livro sobre a Lei nº 11.419, as limitações impostas pelos tribunais – inclusive o formato – são extremamente prejudiciais.
Ele lembra que a linguagem escrita deixou de ser a única forma de se comunicar com a Justiça, já que cada vez mais se gera provas em formato digital – imagens e áudio. “Isso torna inviável a utilização dessas provas nos processos e limita o direito de defesa das partes”, afirma.
Arthur Rosa – De São Paulo