Elaboração, tramitação legislativa, e acordos políticos da Lei n° 8.245/91.

Geraldo Beire Simões

A Lei n° 8.245, de 18 de outubro de 1991, começou a nascer numa visita que fizemos, acompanhando o dr. George de Morais Masset, então Presidente da ABADI, e outros diretores, ao gabinete do dr. Francisco Dorneles, na sede da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, a fim de pleitear solução legislativa para a não incidência de imposto de renda sobre os acessórios da locação, que havia sido criada pela Lei n° 7.713, de 1988. Era janeiro do ano de 1989.
Fomos atendidos no nosso pleito, tendo sido baixada a Medida Provisória n° 39, de 15 de fevereiro de 1999, convertida na Lei n° 7.739, de 16 de março de 1999. Naquela ocasião o dr. Francisco Dorneles disse-nos: ¨Vocês vivem reclamando da vigente lei do inquilinato, porque vocês não preparam minuta de nova lei ? Para ser apresentada na Câmara dos Deputados?
Dr. George de Moraes Masset, rapidamente perguntou: Geraldo você quer preparar um projeto de lei? Aceitei o pedido e comecei, com sacrifício de minha atividade profissional, rascunhar projeto de lei, que até imaginei tornar-se um Código das Locações.

Em torno do mês de maio de 1989, encontrei-me com o então advogado Dr. Sylvio Capanema de Souza no Hospital São Lucas, em Copacabana, quando lá fui visitar minha mãe recém operada e ele estava visitando o pai dele. Disse-me ele: ¨Cheguei de São Paulo e a FENADI – Federação Nacional das Administradoras de Imóveis e eles encomendaram uma nova lei
do inquilinato e eu disse a eles que somente aceitaria a incumbência se você Geraldo ¨topasse¨ trabalhar junto comigo.¨ Respondi que já havia iniciado os primeiros rascunhos, por encomenda
da ABADI, e que estava pronto a fazermos o trabalho de ¨mão dupla¨.

No início reuníamos no escritório dele Prof. Capanema, na Avenida Almirante Barroso nº 63, todas as sextas- feiras, e fomos elaborando umas fichas para cada artigo ou parágrafo que escrevíamos. O professor Pedro Antônio Barbosa Cantizano participou de algumas reuniões.

Numa determinada semana, houve um feriado numa quinta-feira e aí resolvemos emendar a quinta, a sexta e o sábado, durante todo o dia, no escritório dele Prof. Capanema, e no domingo, no apartamento dele na Tijuca. Ficou pronto o primeiro borrão no mês de setembro de 1989. Fiquei encarregado de reprografar as fichas datilografadas (naquela ocasião ainda não usavamos computador) e montá-las em ordem numérica dos artigos e parágrafos, incisos e alíneas. Novas reuniões fizemos e novos ¨retoques¨ procedemos.

Tudo pronto, submetemos a ¨boneca¨ aos participantes da CONAI – Convenção Nacional dos Administradores de Imóveis, realizada em outubro de 1989, em Curitiba, no Paraná, onde novas sugestões acolhemos.

No regresso ao Rio de Janeiro, elaboramos em forma definitiva o anteprojeto que foi entregue à FENADI, e esta, em novembro de 1989 encaminhou à assessoria do novo Presidente da República que havia sido eleito na eleição de 1989, com a seguinte mensagem:

“PROJETO DA NOVA LEI DO INQUILINATO
Os empresários do setor de administração de imóveis, cientes da gravidade da crise habitacional que afeta o país e atormenta milhões de brasileiros, resolveram dar contribuição direta e eficaz às iniciativas que possam contribuir para mudar esse estado de coisas. Assim pensando, e conscientes de suas responsabilidades sociais, ousaram encomendar, por conta e riscos próprios, um trabalho jurídico de fôlego que possa vir a substituir, no estamento jurídico-legal do país, a já ultrapassada Lei nº 6.649/79.
Sob o princípio que o texto deve ser claro, conciso, justo intérprete de si mesmo, os juristas Sylvio Capanema de Souza, Geraldo Beire Simões e Pedro Antônio Barbosa Cantizano, trabalharam durante vários meses na elaboração deste projeto que foi, depois, submetido à apreciação e aprovação das administradoras, em Congresso Nacional, realizada por esta Federação, em Outubro, no estado do Paraná.
Temos, enfim, um texto legal que corrige omissões e falhas da legislação em vigor, abre espaços ao retorno dos investimentos na área habitacional, cria pela primeira vez um instrumental político de apoio ao desenvolvimento das atividades no seguimento habitacional e liberta a locação das amarras que prendem locador e locatário em prejuízo de ambas as partes. Inspira-o a convicção de que a liberdade de contratação é o maior dos incentivos, evidentemente sem se descuidar do aspecto de proteção da parte mais fraca nessa relação, que é o locatário, o qual tem o resguardo, por exemplo, da vinculação das correções do aluguel, à variação da inflação que também serve de parâmetro para proteção dos salários.
Esperamos, portanto, que esse trabalho seja útil às autoridades constituídas na sua tarefa, e indeclinável dever de promover o ajuste imediato da legislação que rege as relações entre inquilinos e proprietários, sob pena de consagrarmos um estado de conflito que se manifesta no caos, hoje representado pela crescente escassez de imóveis para locação, elevação continuada dos alugueres dos imóveis para locação, elevação continuada dos aluguéis dos imóveis vagos e atulhamento da justiça, com dezenas de milhares de ações de despejo.
São Paulo, novembro de 1989
Hubert Gebara
Presidente.¨

Dito anteprojeto, além da assinatura do Presidente da FENADI, foi assinado pelos representantes das entidades: Waldir Francisco Luciano, presidente do COFECI ; Míriam Cristina V. Miranda, Presidente da AABIC/ SP; Mário César da Silveira, presidente da ACEMI/ SC; Aroni Becker, presidente da AGADEMI-RS; João Françolin Tomazini,
presidente da APADI-PR; Raimundo Diógenes Pinheiro, presidente da SBRADI/SECOVI-DF; Américo Gianeti Filho presidente do CDEI-MG; Fernando Santos Gonçalves, presidente do SECOVI/ MS; Luis Fernando K. de Camargo, presidente do SECOVI-PR; Flávio José Gomes, presidente do SECOVI/ RS; Wilson Francisco de Andrade, presidente do SECOVI/SC e Geraldo Beire Simões representado a ABADI-RJ.

Posteriormente, em janeiro de 1990, recebi telefonema do Dr. Hamilton Moraes e Barros, ex juiz do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que era o Chefe do Gabinete do então Ministro da Justiça, Bernardo Cabral, dizendo-me que estava em seu poder o anteprojeto remetido pela FENADI e que o Presidente Fernando Collor estava muito ocupado com a equipe de seu governo preparando as modificações na legislação que iria fazer, por isso depois da posse oficial, em 15 de março de 1990, ele o Dr. Hamilton iria propor a criação de uma Comissão para estudar o assunto e elaborar a proposta legislativa do governo ao Congresso Nacional.

Veio o mês de março de 1990 e ocorreram os fatos de todos conhecidos, com uma série de medidas legais baixadas pelo Governo Federal no campo econômico, denominado Plano Collor.
9. Em setembro de 1990, através da Portaria nº 234, de 19 set. 90, dos Ministros da Justiça; da Economia, Fazenda e Planejamento e da Ação Social foi instituída a Comissão Interministerial para elaborar Anteprojeto de Lei sobre a Locação Predial Urbana, sendo que a Comissão poderia ¨Solicitar a colaboração de associações, de entidades de classe e de profissionais de notória especialização¨ de cuja Comissão fui um dos integrantes.

Referida Comissão foi composta por representantes de locadores, de corretores de imóveis, de contadores, de economistas, de advogados, de empreendedores de ¨Shopping Center¨, de empresas construtoras de imóveis, de seguradoras, de Órgãos de Defesa do Consumidor e muitas outras entidades, e dos locadores, estes representados pela Associação Nacional do
Movimento Permanente dos Inquilinos Intranqüilos, pela sua presidente a aguerrida Dra. Maria Elisa Barbosa Jardim, de cujas sugestões nasceram muitos dispositivos do anteprojeto.

Durante os meses de setembro de 1990 até abril de 1991 reuníamos na Comissão Interministerial, nas dependências do Ministério de Ação Social, inicialmente todas as segundas-feiras, e posteriormente, as segundas e terçasfeiras, e até mesmo incluídas as quartas-feiras, tendo como material base de trabalho o Anteprojeto de nossa autoria, sendo certo que a Comissão recebeu mais de seiscentas sugestões de todos os setores interessados.

No mês de março de 1990, o deputado Nilson Gibson apresentou o Projeto de Lei nº 372/91, constituído da íntegra do nosso Anteprojeto aprovado na 6ª. CONAI, e remetido pela FENADI. No mês de abril de 1991 o Anteprojeto elaborado pela Comissão Interministerial ficou pronto. Havia entendimento no sentido de que após pronto o ¨Borrão¨ do Anteprojeto, eu e os professores Capanema e Cantizano, iríamos nele ¨passar pente fino¨, para escoimar as eventuais impropriedades e colocá-lo de modo escorreito.

Todavia, tendo em vista divergência política que reinava entre as Ministras da Ação Social e da Economia, Fazenda e Planejamento, o anteprojeto foi levado diretamente pela Ministra da Ação Social ao Presidente da Republica. A Presidência da República aceitou o anteprojeto da Comissão, e , sem qualquer modificação, no dia 15 de Maio de 1991, demonstrando sensibilidade com a angustiante questão locatícia, o encaminhou ao Congresso Nacional, através da Mensagem nº 216-A/91, nos termos do 1º do Artigo 64 da Constituição Federal, em regime de urgência, acompanhado da Exposição de Motivos dos Ministros de Estado da Justiça, Economia, Fazenda e Planejamento e da Ação social, com a seguinte redação:
“Excelentíssimo Senhor Presidente da República
Temos a honra de submeter à elevada consideração de Vossa Excelência o projeto de Lei de locações, elaborado pela Comissão Interministerial constituída para este fim.
Reunindo os segmentos mais representativos da sociedade, buscou a comissão ouvir, de forma ampla. locadores, locatários, administradores de imóveis e construtores e, a partir de inúmeras
sugestões encaminhadas, dar expressão jurídica às inquietações que envolvem o mercado de locações de imóveis.

Percebeu-se, sem grande dificuldade, que a atual lei de inquilinato, ao presumir a hipossuficiência de uma das partes na relação locatícia, restou por inviabilizar a locação de imóveis e os investimentos que tradicionalmente eram destinados à construção civil, especialmente na área de habitação. Verificou-se também que a excessiva proteção ao inquilino já instalado, acarretando a queda de investimentos em imóveis residenciais, restou por desconsiderar os inquilinos em potencial, que não dispõem de imóveis para locação.

Criou-se, por força da atual lei de Locações, uma profunda escassez de imóveis residenciais para locação, o que tem levado o mercado a elevar excessivamente o valor inicial do aluguel, gerando, entre outras conseqüências, a elevação dos índices inflacionários.

Certamente, as limitações que a atual legislação impõe ao exercício do direito de retomada podem ser elencadas como obstativas dos investimentos no setor. Mais que isto, a excessiva restrição ao direito de propriedade resultou em cinco milhões de moradias fechadas ou
cedidas, o que não pode ser desconsiderado quando se tem no País 6,5 ( seis vírgula cinco) milhões de moradia em regime de locação.

Sensível às expectativas da sociedade, a Comissão Interministerial buscou criar uma legislação que, de fato, viesse ao encontro das necessidades do mercado de locação residencial, tratando de compor prudentemente os interesses envolvidos. Na proposta ora enviada a Vossa Excelência, garante-se uma estabilidade maior ao locatário na ocupação do imóvel, que só poderá
ser retomado após um prazo mínimo de trinta meses, garantidos ainda mais seis meses para desocupação, caso haja acordo judicial ou extrajudicial. Ao mesmo tempo, garantiu-se, ao contrário da legislação vigente, a possibilidade de não renovação automática do contrato.

Nos contratos residenciais fixados por prazo inferior a trinta meses, a retomada do imóvel só poderá ser viabilizada em hipótese especialíssimas, como para uso próprio, para ascendente ou
descendente, aplicando-se severas penalidades ao retomado insincero. Ainda nos contratos com prazo inferior a trinta meses, facultou-se ao locador a retomada ao término de cinco anos de utilização do imóvel pelo locatário, assegurando-se, também por este mecanismo, a necessária estabilidade do inquilino e de sua família.

Manteve o projeto a Ação Revisional após três anos do contrato, com fixação provisória do aluguel em valor não superior a oitenta por cento do locativo de mercado, nos moldes da orientação anteriormente traçada por Vossa Excelência e já convertida em lei.

Nas locações não residenciais, constatou-se que a atual lei estava a exigir, apenas, pequenos contornos de modernidade, sendo pouco alterada na sua essência. Assegurou-se assim, o direito à ação renovatória às locações em Shopping Center, algo que o antigo Decreto-lei nº 24.150, elaborado no distante ano de 1934, não poderia mesmo prever. As renovatórias, apenas nestes casos, não permitirão a recusa à renovação com fundamento no uso próprio do locador, com que se evitará a rotatividade do fundo de comércio de espaço originalmente destinado à locação.

Nas formas previstas em lei, propõe-se a aplicação do aluguelpena, já previsto no artigo 920 do Código Civil, como forma de assegurar o efetivo cumprimento do contrato. Dentre tantas e profundas alterações, preocupou-se a Comissão em celerizar o andamento das ações de despejo, introduzindo, inclusive, a figura do despejo liminar, nos casos de acordo extrajudicial para a desocupação em seis meses; ruptura de contrato de trabalho em que o imóvel locado ao empregado tenha relação com o emprego e na locação por temporada.

Ainda no intuito de dinamizar o desfecho das ações, retirou-se o efeito suspensivo do recurso contra a sentença que decreta o despejo. Garante-se, com este procedimento, a célere retomada do imóvel e o efetivo cumprimento do acordo antes celebrado entre as partes.

A nova orientação adotada revela que as partes não deverão se prevalecer da morosidade do Poder Judiciário para retardar o resultado de que livremente pactuaram, bem como, ante as abreviações impostas ao rito processual, terão suas despesas com custas e honorários drasticamente reduzidas, já que, inclusive, o ato citatório poderá ser feito por carta com aviso de recebimento.

Há muito o que fazer até que as mencionadas necessidades dos brasileiros por moradia sejam definitivamente supridas. O presente projeto de lei do inquilinato, ao buscar o equilíbrio de mercado através da livre negociação e da ausência de regras excessivamente protecionistas, certamente contribuirá para minimizar o grave problema habitacional do país.

Estas, senhor Presidente, as razões da presente Exposição de Motivos e do Projeto que faz parte da Política Habitacional traçada pelo Ministério da Ação Social e que ora submetemos à decisão final de Vossa Excelência.

Queira aceitar os protestos do nosso mais profundo respeito.

JARBAS GONÇALVES PASSARINHO
Ministro da Justiça
ZÉLIA MARIA CARDOSO DE MELLO
Ministra da Economia, Fazenda e Planejamento.
MARGARIDA MARIA MAIA PROCÓPIO
Ministra da Ação Social”

Dentro no prazo regimental, no mês de maio de 1991, foram apresentadas 207 (duzentas e sete) emendas pelos deputados federais. No Mês de junho de 1991 foi indicado para funcionar como relator da Comissão de Economia, Indústria e Comércio, da Câmara Federal, o deputado Federal Gilson Machado, o qual, por sugestão da diretoria do SINDUSCON – Sindicato da Indústria da Construção Civil do Rio de Janeiro, convidou-me para apreciar as emendas apresentadas e elaborar o Relatório, Parecer e Substitutivo da mencionada Comissão da Economia, Indústria e Comércio, tendo por objetivo não somente as emendas dos deputados, mas também o próprio Projeto de Lei, que havia recebido o nº 912/91.

Durante três dias consecutivos, elaboramos a primeira versão do Relatório, Parecer e Substitutivo, cujo trabalho foi apresentado pelo deputado Gilson Machado aos demais relatores das outras comissões nas quais o Projeto de Lei nº 912/91 estava, por igual, recebendo relatórios, pareceres e substitutivos, ou seja a Comissão de Constituição, Justiça e Redação, sob o relatoria do deputado Renato Vianna; a Comissão de Desenvolvimento Urbano, Interior e Índio, onde era relator o deputado Gustavo Krause, e a Comissão de Defesa do Consumidor, do Meio Ambiente e Minorias na qual funcionava como relator o deputado Aécio Neves.

Mencionados demais relatores, em fato absolutamente inédito no Congresso Nacional, tendo em vista que o Projeto da nova lei do inquilinato atendia aos interesses de todas as partes envolvidas na relação de locação, resolveram examinar em conjunto todas as emendas oferecidas pelos deputados e, de comum acordo, elaborar Relatório, Parecer e Substitutivo
único. Daí em diante, durante vários dias sucessivos, foram realizadas várias audiências públicas e redigidas outras sete versões para atender as reivindicações de vários setores da sociedade, tendo sido finalmente ¨fechada ¨ a última versão e acordo no fim do dia 25 de junho de 1991.

Após esse consenso, o deputado Gilson Machado procurou o deputado Miro Teixeira que liderava um dos partidos da oposição governamental e tinha grande influência nos demais partidos oposicionistas, e que era profundo conhecedor e manipulador das regras regimentais, para saber dele quais os dispositivos do Projeto de Lei nº 912/91 que a oposição aprovaria consensualmente e quais aqueles que deveriam ser decididos no voto.

O deputado Miro Teixeira aprovou alguns dispositivos, discordou de alguns outros e foi radicalmente contrário ao retorno da chamada ¨denuncia vazia ¨, ficando então assentado que o Plenário iria decidir quanto aos temas não consensuais. Publicado o Projeto recebeu ele 137 emendas de plenário, sendo a quase totalidade delas dos partidos da oposição.

A dificuldade que restava superar era convencer o então Presidente da Câmara Federal Deputado Ibsen Pinheiro colocar o Projeto na pauta de votações, tendo, ele dep. Ibsen Pinheiro, não somente aceito o pleito, porque verificou que o projeto estava ungido do beneplácito das quatro comissões mais importantes da Câmara Federal, como também concedeu o regime de
urgência para votação em turno único.

O Projeto 912/91, agora já sob a roupagem de PROJETO DE LEI DA CÂMARA Nº 52, DE 1991, foi colocado na ordem do dia 27 de junho de 1991. O dep. Gilson Machado obteve do Gabinete de liderança do PFL crachás para a nossa pessoa e mais o dr. Alexandre Tiolier, de São Paulo e também ex-integrante da Comissão Interministerial, a fim de que pudéssemos
ingressar no Plenário da Câmara e preparar os rápidos pareceres favoráveis, ou
contrários, a cada uma das emendas do plenário.

Foram discutidos e votados os destaques das emendas que seriam votadas separadamente, para posteriormente, serem votadas ditas emendas, tendo sido algumas aprovadas e outras não, sempre debaixo de ferrenha oposição dos deputados discordantes do projeto, inclusive com suas retiradas maciças do Plenário, com o objetivo de ser obstruída a votação, estratégica que falhou diante da fala da Presidência informando que o jeton não seria pago aqueles deputados que não votassem, tendo eles retornado e participado das votações…

Ocorreu, finalmente, a votação tendo votado 384 deputados, sendo 251 favoráveis e 129 contrários, encaminhado o Projeto mediante ofício ao senado federal. Após essa votação ainda permanecemos mais dois dias em Brasília, a conselho do Dep. Gilson Machado para checar o que foi aprovado, a fim de evitar quaisquer erros na remessa do Projeto ao Senado Federal, e
como detectamos alguns defeitos, foi remetido outro ofício ao senado federal informando.

Veio o recesso da Câmara e do Senado Federal durante todo o mês de Julho de 1991. Durante esse mês procurei o Senador Nelson Carneiro, no ¨senadinho ¨ no Rio de Janeiro, antiga sede do Itamarati, e informei a ele que o Projeto de Lei aprovado pela Câmara foi resultado de consenso das partes interessadas e da maioria dos deputados e seria ideal que o Senado Federal não quebrasse a sua ¨espinha dorsal¨e que fosse, como na câmara votado o mais rapidamente possível. Ele ouviu atentamente e disse que iria designar relator aquele senador que tivesse acabado de ser eleito e ainda tivesse vários anos de mandato pela frente, porque tratando-se de lei do inquilinato a opinião pública poderia, eventualmente, voltar-se contra ele, prejudicando-o em seu reeleição, e que além dessa nomeação iria sugerir a nossa convocação para assessor o senador, tal qual ocorrerá na Câmara dos deputados.

De fato, foi designado relator o senador Élcio Álvares, recém eleito, o qual nos convidou para assessorá-lo no Senado Federal. Perante a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, então presidida pelo senador Nelson Carneiro, foram apresentadas 09 (nove) emendas de autoria de senador Pedro Simão e outras 09 (nove) emendas de autoria de senador Eduardo Matarazzo Suplici, umas pleiteando as supressões de alguns dispositivos; outras dando novas redações; outras modificativas e outras substitutivas.

No parecer nº 279, de 1991, opinou-se pela rejeição de todas as dezoito emendas apresentadas, tendo a Comissão de Constituição, Justiça e cidadania do Senado Federal, oferecido oito emendas de redação, ou seja, dita comissão aprovou quase que integralmente o projeto vindo da Câmara dos Deputados.

Plenário do Senado Federal foram apresentadas novas outras emendas. Nessa ocasião ocorreu outro fato visto no Congresso Nacional. Datada de 3 de setembro de 1991, o Presidente da FENADI, Luis Valdir Nardeli, representando os locadores, e a Presidente da ASSOCIAÇÃO NACIONAL DO MOVIMENTO PERMANENTE DOS INQUILINOS INTRANQUILOS, Maria Elisa Jardim Barboza, representando os locatários, de mãos dadas, entregaram a cada senador carta, contendo os seguintes dizeres:

“Excelentíssimo Senador
Referente Lei do Inquilinato
A FENADI – Federação Nacional das Associações das Administradoras de Imóveis e Condomínios e a Associação Nacional do Movimento Permanente dos Inquilinos Intranqüilos, solicitam a V.Exa. o comparecimento à votação do Projeto acima referido, que está na Ordem
do dia 04.09.91, nesta quarta-feira às 14:30 horas. Estas entidades solicitam a V.Exa. que votem o referido projeto, observando o esforço havido na Câmara dos Deputados com um parecer único elaborado pelos 4 Relatores, das 4 Comissões. Fato Inédito”.

No dia 04 de setembro de 1991, usou da palavra o senador Élcio Alvares, na qualidade de membro da CCJ, reformulando o parecer dado à Emenda nº 24, concluindo favoravelmente. Foi aprovado o Projeto, ressalvados os destaques concedidos às Emendas e Subemendas, tendo o senador Josaphat Marinho encaminhado declaração de voto à Mesa. Passando-se à Votação dos destaques, verificou-se o seguinte resultado:

RQS nº 570/91 aprovado; RQS nºs 571 a 574/91 rejeitados; ficando prejudicados os de nº 577 a 580/91 e prejudica a emenda nº35. Aprovadas, em globo, as Emendas nº 8 e 13, 19 a 24, 34 a 35 de parecer favorável; e rejeitadas as de nº 1 a 7, 9 a 11, 14 a 18, 25, 28 a 30, de parecer contrário, ressalvados os destaques requeridos. Passando à votação dos destaques relativos às emendas, verificouse o seguinte resultado: RQS nºs 575 e 576/91 rejeitados; Emenda nº 32
rejeitada. Concluindo a votação da matéria, é aprovada a Subemenda à Emenda nº 12, ficando em conseqüência prejudicada a emenda nº 12.

Foi lido o parecer nº218 da CDIR, relatado pelo senador Dirceu Carneiro, oferecendo a Redação Final das Emendas do Senado ao Projeto, foi remetido à Câmara Federal com o Ofício/SM nº 896 de 09 de setembro de 1991.

Durante a votação, o senador Élcio Álvares disse da Tribuna, dentre outras palavras, disse que ¨Gostaria de assinalar que houve uma verdadeira engenharia jurídica em torno dessa lei do Inquilinato. A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, através da Participação vibrante do senador Mauricio Correa, demonstrou muito bem que desta feita houve uma preocupação, realmente, até uma expressão que já está se tornando conhecida – do locador não sair sorrindo e nem o locatário sair chorando.¨

Outra vez na Câmara dos Deputados assessoramos o Deputado Gilson Machado, Relator da Comissão de Economia, Indústria e Comércio, na elaboração do Parecer sobre as emendas do Senado Federal, opinando pelo acolhimento das emendas de números 01 a 09 e 11 e 12, e pela rejeição de emenda nº 10.

Aludida Emenda nº 10 pretendia suprimir o art. 80 do Projeto, hoje art. 82 da lei nº 8.245/91, que acrescia ao art. 3º da Lei nº 8.099, de 29 de Março de 1990, mais uma exceção, qual seja de permitir a penhorabilidade de imóvel ¨Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.”

As razões para a mencionada rejeição foram as seguintes:

“ O escopo, de todo louvável, da referida Lei 8.009/90 foi proteger o bem da família. Acontece podem, que tornou mais difícil o locatário obter fiança de pessoa possuidora de somente um imóvel ( que não constitua seu bem de família ), inviabilizado, até mesmo, que pai possa ser fiador do seu próprio filho, se, ele pai, não dispuser de mais de um imóvel.

Desde o advento da aludida Lei nº 8.099/90 que o número de fiadores profissionais cresceu assustadoramente, em prejuízo dos locatários, que são obrigados a pagar vultuosas somas para conseguirem fiadores, que atingem, no mais das vezes, valor equivalente a cinco alugueres.

Ademais, o texto primitivo desta Câmara dos Deputados constou com parecer único de quatro relatores e seu alcance social é inegável, uma vez que mais de 80% da população só possui um único imóvel, tornando assim, impossível a obtenção de crédito para fiança, porquanto os locadores só aceitam garantia de pessoas que sejam proprietárias, no mínimo, de dois
imóveis.

Assim é de toda conveniência que seja mantido o dispositivo suprimido pelo Senado, justamente para evitar prejuízos aos locatários, cujo dispositivo tem a seguinte redação:

¨Art. 80 O art.3º, da Lei nº 8.009, de 29 de Março de 1990, passa a vigorar acrescido do seguinte inciso VII:
¨VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação¨.

Por sua vez, a Comissão de Constituição e Justiça e de Redação da Câmara dos Deputados sob a relatoria do deputado Nilson Gibson, também aprovou as emendas de nºs 1 a 9 e 11 e12 e rejeitou a Emenda nº 10, todas do senado federal, pelo que ficou mantida a redação do art. 80 do Projeto, hoje art. 82 da Lei nº 8.245/91.

Votados ambos os Pareces no Plenário da Câmara dos Deputados, foi, finalmente, aprovado o Projeto que, subindo à sanção Presidencial, foi convertido na Lei nº 8.245/91, no dia 18 de setembro de 1991, terminada, desse modo o nosso ciclo da nossa atividade, iniciada no mês de Janeiro de 1989 e terminada no mês de setembro de 1991, ou seja, exatos 19 (dezenove) meses de inúmeras e inúmeras reuniões, demarches políticas, dias e dias passados em Brasília nas comissões do Congresso, elaborações de redações de diversas versões do Projeto até chegar-se ao ponto final.

O ¨ Jornal do Brasil¨ ¨ CICLO ENCERRADO¨, acentuando que ¨(…) a questão do inquilinato tem sido um prato feito para a demagogia na casa alheia. Movido pelo intervencionismo estatal que prosperou depois da segunda guerra, o Brasil teve nada menos de 52 leis do inquilinato desde então. Foi quase uma lei por ano, com os piores resultados possíveis¨.

O “Estado de São Paulo”, debaixo do título ¨AVANÇOS NO INQUILINATO¨ registrou que “A nova lei pode não ser a ideal, mas caminha na direção certa, ao conferir um pouco mais de liberdade entre as partes contratantes numa locação residencial e ao permitir que se revejam
em determinado prazo, a injusta situação de locadores na prática expropriados de seus imóveis – às vezes conseguidos com o esforço de uma vida de trabalho, para uma renda adicional capaz de propiciar alguma tranqüilidade na velhice¨.

A “Folha de São Paulo”, sob o título “NOVO INQUILINATO” disse que ¨Um intervencionismo que obrigou uma série de proprietários a simplesmente fecharem seus imóveis, desestimulou investimentos na área locatícia e criou uma situação de extrema iniqüidade, em que locatários de imóveis semelhantes acabam pagando aluguéis totalmente díspares. Ao restabelecer o direito do Proprietário de reaver o imóvel nos contratos vigentes (…) o substitutivo minora um dos principais fatores inibidores da oferta nos últimos anos.”

Diversas outras manifestações dos jornais podem ser citadas, tais quais: ¨Nova Lei não desagrada os inquilinos¨; ¨Nova Lei deve estimular a oferta de imóveis na capital”; “Imóvel volta a ser opção para aplicar com segurança”; “Lei do Inquilinato. Empresários de Minas otimistas com novas regras”; “Aluguel: denuncia vazia forçará acordos”; “Inquilinos aceitam a denuncia vazia”; “Os aluguéis baixam”; “Preços podem cair a metade em São Paulo”; “Denuncia vazia pode reduzir os aluguéis; “Denúncia vazia pode facilitar locação”; “”Projeto de lei suaviza os efeitos da denúncia vazia”; “Milhões de imóveis deverão voltar ao mercado”; “Lei do inquilinato reaquecerá a construção civil”; “A força dos inquilinos. Locatário ganha poder e negociação e força proprietário a reduzir valor dos aluguéis”; “Nova lei faz cair ações de despejo”.

Muitas e muitas outras manifestações poderiam ser invocados em prol da Lei do Inquilinato. A nosso aviso, o melhor retrato da Lei nº 8.245/91 foi efetuado pelo então deputado federal Gustavo Krause, um dos quatro relatores do Projeto na Câmara dos Deputados, em artigo publicado no jornal “O GLOBO” sob o genial título: ¨ NEM LO(U)CADOR, NEM LOCA(O)TÁRIO¨.

Como disse o desembargador Wilson Marques, em palestra na ABADI ¨essa foi a lei possível¨, dentro do contexto em que foi elaborada, quando vigia verdadeira ¨guerra¨ entre locadores e locatários.” Se conseguimos, como o nosso trabalho e empenho leal e desprendido, que essa ¨guerra ¨ tornar-se paz entre locadores e locatários, no curso dos vinte anos de vigência da Lei do Inquilinato, estamos recompensados.

Rio de Janeiro, 21 de outubro de 2011
Geraldo Beire Simões

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